Ortodoxia 2000

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O Papa de Roma na Ortodoxia

[Por José Lauro Strapasson]

Costuma-se dizer que a Igreja Ortodoxa não aceita o Papa romano. Isso não poderia ser maior inverdade. Por exemplo, no ano litúrgico ortodoxo (bizantino) que começa em Setembro e que cuja primeira grande festa é a Natividade de Maria Santíssima, sempre virgem e Mãe de Deus, há vários dias que se comemoram santos que foram nada menos que justamente Papas de Roma. Por exemplo, no dia 24 de novembro se comemora São Clemente, papa de Roma (+100), junto com São Pedro de Alexandria. No dia 2 de janeiro se comemora São Silvestre (+335) que também era Papa de Roma. No dia 18 de fevereiro se comemora São Leão (+441), o Grande, Papa de Roma, São Gregório (+604), o grande, no dia 12 de março. No dia 13 de abril, São Martinho I, (+655), Papa de Roma. Infelizmente houve a separação (cisma) das igrejas do ocidente e do oriente e assim Roma foi para um lado enquanto a Ortodoxia foi para o outro. Mas mesmo assim, os Santos Papas de Roma do passado continuaram a serem lembrados durante o ano litúrgico.
Na Ortodoxia, no entanto, a palavra Papa, que significa pai, não é um título exclusivo do Papa de Roma, podendo ser conferido a outros, assim, o Patriarca de Alexandria, por exemplo, também tem o título de Papa.
Evidentemente a Igreja Ortodoxa não reconhece certos dogmas tardios introduzidos no ocidente como o Papa como "cabeça da Igreja", uma vez que só Cristo é a cabeça da Igreja. Falar de cabeça visível ou cabeça invisível é pior ainda pois a cabeça é aquela parte do corpo que pensa e a Igreja não pode ser um "monstro de duas cabeças". Nem pode servir a dois senhores ao mesmo tempo e  não importa se um senhor é visível ou não. Algum santo cujo nome me foge dizia que o menor espaço entre a cabeça e o corpo nos faria morrer.
No primeiro milênio o Papa de Roma tinha sempre a última palavra, mas isso nunca foi entendido como "infalibilidade". Para a Ortodoxia é a Igreja que é infalível pois Cristo mostrou que dessa vez a sua aliança é perene e por isso a Igreja embora se adaptando aos tempos não pode sofrer mudanças doutrinárias.
Também não se pensa no Papa romano como "Vigário de Cristo na Terra" ou tantas outras coisas desse tipo.
Quanto a ser sucessor de São Pedro no Primado isso é mais ou menos aceito. Mais ou menos por dois motivos. Primeiro porque na Ortodoxia se entende que todo bispo é sucessor de São Pedro no Primado, e o poder desse primado nada mais seria que o não pequeno poder de presidir a ceia eucarística.
Em segundo, para Ortodoxia, embora São Pedro fosse de fato preferido, não se vê nele um chefe absoluto, mas o primeiro entre os 12 apóstolos. A palavra "primado" vem de primeiro, significando "Primeiro entre iguais" e assim da mesma forma que São Pedro era primeiro mas não melhor que os outros apóstolos o Papa de Roma era primeiro entre os patriarcas e bispos mas não melhor que eles. Embora muitos santos e padres do primeiro milênio tenham ensinado errado se reconhece que a primazia de Roma tem sua origem nos Concílios Ecumênicos e no império romano. Não se pode esquecer que uma primazia do Papa romano não tem origem na de Pedro uma vez que a Igreja de Roma não foi a única fundada por São Pedro, (a de Antioquia foi fundada também por São Pedro, e a de Alexandria por São Marcos, discípulo de Pedro). Só a natureza imperial desse primado é que pode explicar porque Roma teve o primeiro lugar e Constantinopla (igreja funda por Santo André) teve o segundo. A primazia de Roma era portanto de origem imperial e era de honra, de "primeiro entre iguais", e oxalá volte um dia a ser assim. Então nesse dia Roma recuperará seu primeiro lugar de honra perdido.

Com a palavra, a Bíblia:

Portanto, havendo entre vós rivalidades e contendas, não é por que sois carnais e andais segundo o homem? Porque quando um diz: Eu sou de Paulo; e o outro: Eu sou de Apolo, não procedeis como homens carnais? Que é pois, Apolo? e que é Paulo? Ministros daquele, em quem vós crestes e segundo o que o Senhor deu a cada um. Eu plantei, Apolo regou, mas Deus deu o crescimento. De modo que não é nada nem o que planta, nem o que rega, mas Deus, que dá o crescimento. 1Cor 3, 4-7.

Porque ninguém pode pôr outro outro fundamento, senão o que foi posto, que é Jesus Cristo. 1Cor 3,11.

Portanto ninguém se glorie entre os homens. Porque todas as coisas são vossas: Paulo, Apolo, Cefas, o mundo, a vida, a morte, as coisas presentes, as futuras, tudo é vosso, mas vós sois de Cristo, e Cristo de Deus. 1Cor 3,21-22.


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| Página atualizada em 16 de fevereiro de 2006 |